Que o amigo seja para vós a festa da terra

26 novembro 2010

Planódia
























Páscoa 2006


Planódia

Dedico este texto a Pedro A.H. Paixão e Rui Moreira

pela constante partilha na disposição ao encontro.

Introdução

Uma coisa é um texto para filósofos, outra coisa é um texto para toda a gente, e como este texto está aqui publicado para ser lido por toda a gente, pelo menos toda a gente que visita o Projecto 10, a sua leitura tenta ser tão acessível quanto possa. No entanto, algumas ideias são tão difíceis de tornar acessíveis que o esforço desta escrita poderá resultar completamente chato. Sendo assim, e porque é necessário contemplar as duas abordagens, a mais simples e a mais complexa, resolvi dividir o assunto em duas partes. Começo pela primeira num tom coloquial e estilo mais narrativo, para depois me concentrar nas dificuldades filosóficas que pretendo focar no assunto proposto.

Antes de mais convido-vos a ler a apresentação do editor que me convidou, é uma bela nota de esclarecimento: é importante perceber que em ciências sociais, ou não há “ciências” ou não há “sociais”, mas não é por isso que deixamos de lhes falar. Leiam! E a filosofia não é nem ciência nem ciência social, esta última uma contradição nos termos, mas ainda assim também não deixa de ser uma disciplina científica com todos os rigores que têm quaisquer destas disciplinas.

Aproveito ainda para dizer que o título deste texto, transliteração do grego planvodia, não se refere a uma paródia, embora todo o texto que se escreva não vá muito além disso, e esclareço que se trata da mera colocação correcta do nosso lugar enquanto seres errantes. Do “errar é humano” deve ler-se deambular, a natureza nómada da nossa condição na descoberta das coisas. Todos os Homens são seres errantes, que andam estrada fora, e o que os distingue entre si é o modo como o fazem.

A Ciência e a Filosofia

Desde que me lembro de mim a maior parte das pessoas pergunta porque é que há uns quantos, muito poucos, que resolvem, ou resolveram dedicar-se a pensar mais que a maioria, uma vez que o que eles fazem ou fizeram não parece ser tão útil como é aquilo que outros, que pertencem a um grupo maior, fazem como contribuição para a nossa compreensão do como é que as coisas funcionam e devem ser aplicadas. Para que serve perguntar porquê quando nos parece que o necessário é saber como?

Para que serve a filosofia quando temos a ciência? Ou melhor, o que é isso de filosofia, não é uma disciplina obscura dos primórdios da ciência? — Pausa para pensar com um dedo encostado ao queixo e um leve vocalizar gutural — O que é que a filosofia ainda nos trás de novo para que a ciência não tenha dado já resposta? A filosofia não serve para nada… É o que provam as políticas que se têm vindo a propor na educação: uma disciplina que deixou de fazer sentido e não tem qualquer utilidade prática, nem para o conhecimento nem para a formação do indivíduo, senão porque se proporia deixar de fazer parte do currículo geral? A tendência é esquecer a natureza criadora dos conceitos porque eles já estão todos postos e basta tratar da sua actuação, como se articulam e aplicam, etc. O porquê não interessa, já não preciso saber o porquê das coisas, isso ficou resolvido a partir do momento em que o marketing, a publicidade e outras disciplinas semelhantes nos revelaram que afinal quem cria conceitos não é a filosofia. Essa disciplina empoeirada, densa e difícil que só dá acesso a alguns, e que implica anos e anos a fio de estudos, para perceber arduamente o que essas e outras disciplinas nos mostram ser tão simples e fácil de entender... Para quê, para quê complicar o que é tão simples??? Não dá para perceber… Vejam mas é televisão e dediquem-se à ciência que a filosofia é uma perda de tempo.

Este é o tom que nos rodeia desde Tales, o sábio de Mileto, quando a escrava Trácia o gozava por ter caído num buraco enquanto olhava para as estrelas. Ele não olhava para as estrelas, lia-as, e dessas leituras chegou a tomar decisões com imenso resultado prático económico. Sim, lucros financeiros, lucros na venda de um terreno seco e morto que tinha comprado muito barato, quando soube pelas estrelas que iria ser renovado com uma cheia. Trácia não sabia o que gozava. Mas podemos dizer que este episódio antigo está no foro da ciência e não da filosofia, e de certa forma não poderia pertencer à filosofia porque esta só nasce mais tarde com o fim da época dos sábios. Costumamos dizer que filosofia é o amor pela sabedoria, mas essa noção está tão errada quanto é errado assumir que as palavras compostas a começar por filo são o amor do que quer que seja, ou então temos de tomar o amor como nos apresentou Platão no Fedro, uma mania, uma entrega delirante. A filosofia é a entrega ao saber sobre uma forma da loucura que afecta alguns até à alma, é o prendimento obsessivo pela senda do saber, é o nobre entusiasmo de regressar à sabedoria, é uma das formas mais altas da total abertura ao encontro.

Mas o episódio de Tales também não pertence à ciência, essa virá mais tarde. Podemos dizer que é um episódio na história da filosofia, tanto quanto apraz à tradição dizê-lo pré-socrático. Foram escassas as épocas em que os filósofos eram verdadeiramente tidos em conta. Todos sabemos que os cientistas são fundamentais para as nossas sociedades, mas, e os filósofos, fazem alguma coisa de útil? Aparentemente não, embora se acabe a perceber que sim. Mas, então o que é que a filosofia faz de facto que a ciência não conhece? A resposta não é simples, pelo menos não é tão simples como era quando Bertrand Russell a deu acerca d’O Valor da Filosofia enquanto um d’Os Problemas da Filosofia. Segundo o filósofo analítico inglês, (…) mal se torna possível um conhecimento preciso naquilo que concerne a determinado assunto, logo perde o nome de filosofia, para se tornar uma ciência especial. (…) E assim nos mostra que enquanto a filosofia vai descobrindo o porquê das coisas, as relega à ciência para lhes descobrir o como. É a filosofia que perde sentido num objecto de estudo que já conhece, e é desse conhecimento que nasce a ciência.

O termo “ciência” é a versão latina para a grega epistéme, raiz de onde vem a epistemologia, disciplina filosófica que trata das ciências e do conhecimento científico, o discurso sobre as ciências. A epistéme é um tipo de crença, uma crença verdadeira justificada, mas não deixa de ser uma crença. Assenta obrigatoriamente em dogmas verificáveis que podem variar consoante o surgimento de novos dados. A ciência, numa direcção contrária à da filosofia, é a disciplina por excelência da procura. A procura daqueles elementos que vão permitir provar e demonstrar como é que o provável se torna verdadeiro. O cientista sabe muito bem o que procura, o que não quer dizer que não encontre fora do que procurava, e aí ganha um contorno mais aberto, próprio da filosofia. Nada é absolutamente uma única coisa. A ciência, em última análise, não é tão diferente quanto isso de uma religião que se mantém aberta à descoberta de um novo texto sagrado, mesmo que este contradiga o anterior, embora lhe seja tão resistente que só aceita mudar os seus dogmas depois de uma muito aturada verificação. Um pouco como acontece na proliferação das diversas escolas do Budismo, a diferença é que este assume e postula inteiramente a necessidade e importância da crença.

A filosofia, por sua vez, actua como pedra de toque na desambiguação entre o que é caminho para a verdade e o que não passa de uma prisão dogmática, libertando o conhecimento humano dos preconceitos que o levam a seguir as fórmulas estabelecidas. Sempre que se levanta o véu de um problema resolvido para encontrar outro, torna-se necessário regressar à filosofia para esclarecer o âmbito de acção deste segundo. É aqui que se percebe que a resposta de Russell tende a ser um pouco simplista, ou desactualizada, até mesmo para a sua época. A física, cuja ciência se podia dizer de facto scientia (conhecimento do certo), em meados do séc. XX começou a assumir contornos muito menos definidos. Com a introdução da mecânica quântica, o núcleo duro da ciência inaugurou uma linha científica de possibilidades que têm vindo a questionar tudo o que temos como certo nas leis da física. Hoje em dia não é estranho ter um físico como um ser espiritual enigmático, cujas respostas ao funcionamento da realidade física não cessam de nos trazer espanto e perplexidades, algo que sempre foi muito mais comum na filosofia.

Segundo a mecânica quântica, e isto tem vindo a exponenciar-se com a evolução dos aceleradores de partículas, afinal não estamos num mundo de quatro dimensões. Enquanto que a nossa percepção só conhece as quatro dimensões espácio-temporais, segundo os físicos proponentes da teoria das supercordas (superstring theory) a realidade tem de ser composta por inúmeras mais, para que a mecânica quântica se possa compatibilizar com a teoria da relatividade de Einstein. Ambas estão certas (são ciência) mas quando se juntam para criar uma teoria unificadora, a Teoria de Tudo, TOE (theory of everything), as suas verdades contradizem-se, obrigando à colocação de outras dimensões. Chegam a ser propostas 22 dimensões extra, como é o caso das resultantes na equação de Polyakov. Mas não ficamos por aqui, as propostas estranhas são muitas mais, e é preciso estofo filosófico, diria até religioso, para seguir a viagem da física nos dias de hoje.

Com a evolução dos grandes aceleradores de partículas, como é o caso do já tão afamado LHC (Large Hadron Collider) do CERN (Conseil Européen pour la Recherche Nucléaire, actualmente Organisation Européenne pour la Recherche Nucléaire), parece possível estender as fronteiras além do imaginável, e o físico começa a ter verdadeiramente uma atitude filosófica de encontro ao desconhecido, ultrapassando a mera procura da ciência. Uma das propostas que mais maravilha, é o facto das partículas constituintes da matéria, os quarks, poderem precisar da nossa atenção para virem à existência, postulando o que já se conhece no Budismo há milénios, que toda a realidade é produzida pela imaginação e que sem nós, seres humanos, nada existiria. Igualmente interessante é o que acontece quando se separam duas partículas que sempre estiveram juntas, distanciando-as em muitos quilómetros. Quando estas estão juntas é normal que a nossa acção sobre elas produza em ambas o mesmo efeito, afinal estamos a agir sobre as duas ao mesmo tempo com o mesmo princípio de acção, mas o inacreditável acontece quando as separamos a uma distância que é incalculável à nossa percepção sem recorrermos às unidades métricas. Separadas por milhares de quilómetros, elas agem como se estivessem juntas. Quando se age sobre uma delas num lugar, no outro a que foi separada parece reagir concomitantemente tal e qual como aquela sobre a qual se agiu. Mistérios que ainda pouco nos atrevemos a formular como ciência, embora tenham sido levantados pela disciplina que sempre foi o seu baluarte. A tendência natural para o futuro, parece agora, é o regresso da ciência à filosofia, não das disciplinas que nunca deixaram de lhe pertencer, como é o caso da psicologia, essa nunca foi nem nunca será verdadeiramente uma ciência, por mais ciência social que lhe queiramos chamar, mas de ciências como a física, que se atrevem a romper as barreiras para aventurar-se no mundo dos “porquês” quando os “comos” já não satisfazem. Esta nova forma de ciência mais próxima de regresso à filosofia, já se apresenta como consciente de que a verdade, enquanto a procuramos, se poderá dar como resultado de uma nossa doação de sentido. Estamos quase a pôr em jogo a possibilidade de aceitar que toda a existência é produto da imaginação…

A procura e o encontro

Tanto a filosofia como a ciência desejam a mesma coisa, a verdade, a grande diferença entre elas está na sua metodologia. É a diferença entre as noções de procura e de encontro no caminho para a verdade. No Siddhartha, Hermann Hesse diz que (…) Procurar significa ter um objectivo, mas encontrar significa ser livre, ser receptivo, não ter nenhuma meta (…).

A procura, que é no que consiste o método científico para a busca da verdade, pressupõe uma rede de aplicação com a qual se pode averiguar o que consideramos ser real, uma vez que a consciência das ilusões em que vivemos nos leva a precisar uma confirmação válida do que parece encontrar-se. Trata-se de uma linha orientadora que se dirige por um sistema de adequação, a coincidência entre o supostamente encontrado e a rede lógica de um sistema de procura, que leva à obtenção de respostas num campo de probabilidades. O encontro, por outro lado, pressupõe o despojamento dessa rede predefinida, logo, a sua verdade não se dá por coincidência e sim por disponibilidade e abertura ao improvável. A tessitura que está na base estruturante da procura acaba por limitar o encontro nas possibilidades previstas por ela mesma. É certo que esse tecido vai crescendo, adaptando-se à realidade que procura, sempre na medida em que cauteriza os seus insucessos, mas nunca chega a avançar além disso, está preso a si próprio.

A estrutura preconcebida que está na base da procura resulta numa constante e ousada transgressão do dado real, uma vez que este não está efectivamente disponível, porque a sua preconcepção impossibilita o acesso à concepção própria das coisas por si mesmas. A nossa constituição enquanto seres compreensivos leva-nos a interpretar a realidade, revestindo todos os dados que nos chegam com a nossa doação de sentido. As coisas são para nós o que nós esperamos que elas sejam, e quando surge uma dificuldade compreensiva parece que nos é preferível adaptar o objecto difícil ao nosso entendimento, que o nosso entendimento ao objecto que não quer deixar-se conhecer. Fazemos isto sempre que é necessário suprir a angústia das incertezas e inseguranças que nos são colocadas pelo desconhecido, e isto ganha proporções desmedidas quando nos colocamos no modo da procura em vez de nos disponibilizarmos abertamente ao encontro. Esta insegurança provocada pela resistência que o desconhecido impõe na formação de conhecimento, leva-nos a ter para com os objectos do nosso contacto, um tipo de entendimento que os coloca num nómos adequado, de modo a dar à nossa relação com eles um sentido de coerência, para não arriscar cair na angústia em que uma possível falta de sentido nos depõe. Nómos, aqui, não só designa o uso ou o costume, a tradição, lei ou regra, como também significa o canto e a melodia que unifica a continuidade das percepções. A nossa compreensão da realidade, ou melhor, a nossa versão da realidade nunca chega a ser certa e definitiva, tal como sugere a lei fundamental do Budismo — a lei da impermanência. Isto é incontornável, mesmo que consigamos compreender um dado problema num certo momento, as coisas não se mantêm as mesmas ad infinitum. O nosso conhecimento é limitado e a nossa capacidade de o formar é falível, por isso é inevitável que se formem compreensões ilusórias, e o modo que a estrutura própria da procura tem para suprir o problema das nossas ilusões, é articular um sistema de referências de modo a permitir uma análise epistémica dos aparentes dados com que lidamos.

Numa concepção ortopráxica da realidade, em que a prática certa tem mais importância que a opinião certa, isto não acontece tanto desta forma, o que não significa que a ortopraxia nos deixe completamente de fora dos problemas da angústia, simplesmente acontece que na ortopraxia não há lugar para pensar a insuficiência da crença. A dúvida não é um dos seus dispositivos, ela pertence-nos enquanto demiurgos ortodoxos, que achamos que sabemos, que precisamos de saber, e é na dúvida que se coloca a resistência do desconhecido. Eis porque tantas pessoas se devotam ao culto das suas religiões, porque é na observação das práticas que se resolvem as dúvidas, é na fé que o religioso combate a angústia. Pela ordem de um conhecimento limitado a dúvida não tem solução possível em opiniões, e acaba sempre por vencer as crenças verdadeiras justificadas. É preciso abrir mais que isso. A fé é uma solução possível, mas a fé não nos fala da verdade das coisas, ela não nos leva a um conhecimento que procure ver-se livre da nossa doação de sentido. Se as coisas têm o seu ser próprio, o seu ser em si mesmas, e pretendemos estar abertos a encontrar mais do que procuramos, é preciso ir além da fé. A fé é fé em alguma coisa, implica abertura ao desconhecido mas já está para lá da abertura, no conforto de que as coisas são de uma determinada maneira. No entanto, o que me parece ser muito interessante na fé para esta investigação, é que uma fé inabalável anula o desconhecido, porque se temos fé num determinado improvável não desconhecemos que possa provar-se.

Na ortodoxia, a ordem da opinião certa, não chegamos a ter em consideração prática a lei da impermanência e vivemos o sofrimento constante da perda das nossas determinações de valor, sejam elas exteriores ou interiores à nossa relação corpórea e mental. Torna-se para nós mais importante toda a estrutura do passado que a abertura para o caminho que nos depõe sobre o futuro e permite verdadeiramente encontrar. O facto de termos necessidade da estruturação dessa rede básica de confronto leva-nos, pelo prendimento a ela, a ser incapazes do verdadeiro encontro: este, para dar-se, implica um tipo de abertura que nos depõe sobre um plano místico de incertezas. Enquanto quem procura já sabe, até certo ponto, o que pode ou vai encontrar, quem encontra não sabe que o procurava, e se sabia não pode saber que o que tenha encontrado não é mais que uma sua doação de sentido. Se encontramos o que procurávamos, o que encontrámos foi tingido pela procura. Mas…, será mesmo possível encontrar sem procurar?

No fundo, tanto aquele que encontra como aquele que procura, estão ambos num mesmo sistema de procura, mas cada qual num ponto de vista muito diverso quanto a este sistema. Ao dar-se início uma procura, a partir duma estrutura prévia de encontros possíveis, limitam-se as possibilidades futuras de um encontro não previsto, e o verdadeiro encontro, ou encontro puro, fica adiado. Contudo a procura está sempre presente, mas a procura que pode levar ao encontro acaba por não ser propriamente uma procura no sentido em que a entendemos. Imagine-se um corpo a partir do qual se exerce a procura, este corpo pode ser a dita estrutura entretecida das nossas referências; se o atravessarmos ficamos depostos no fim do percurso, repletos das suas determinações e a estruturação coerente da sua forma dificilmente nos libertará para uma compreensão que a exclua ou contorne, todavia, será ilusório pensar que o podemos eliminar de todo da nossa constituição compreensiva, ele pertence à nossa identidade intrínseca enquanto indivíduos no mundo. Continuemos a imaginar o mesmo corpo, agora, em vez de o atravessarmos observamo-lo de longe, no topo de um ponto de vista elevado, o de quem pretende vir a encontrar algo que não tem de se adequar à estrutura do corpo. Este corpo mantém-se presente mas subsumido numa abertura livre das suas determinações, para isto é essencial manter a melhor e mais desperta atenção à abertura, e assim torna-se possível o desvelar de uma verdade que não se concebe pela adequação à tessitura das referências. Esta dita procura terá, pela sua subsunção com a abertura para o encontro, uma continuidade na concomitância do corpo atravessado com o ponto de vista elevado. O corpo está presente, não há outra forma de seguir uma prática senão de corpo presente, mas este não chega a tingir o resultado da procura e o encontro pode dar-se tão puro e verdadeiro quanto possível.

Este corpo de que falo pode ser o nosso próprio corpo, mas aqui, independentemente do corpo ser ou não ser o nosso, interessa mais a sua noção como meio, aquilo que está no entre que estabelece a distância entre a colocação de um objectivo, pela procura, e uma suposta verdade no fim alcançado do que ela procurava. Interessa-nos o entre, o metaxú, o platónico meio entre o minimamente o maximamente cognoscível. Digamos que nestas duas abordagens ao corpo intermédio, ele tanto é caminho para si, para o objectivo que aponta, como é caminho em si, não dependendo do que aponta no objectivo. O facto é que este corpo é tanto em si como para si e a nossa posição nele não deixa de oscilar entre ambas as formas subsumidas, e é aí que nos devemos manter, entre a sístole e a diástole de um coração que não pára de bater. A verdade interessa tanto menos quanto mais ela se apresenta como definitiva e resolvida, porque é muito difícil (se não impossível) distinguir entre o que é e o que parece ser, e ela não cessa de colocar-se renovada.

Todavia, pergunta o leitor deste texto, será possível o encontro de algo que não nos pertença já? Conseguimos vislumbrar uma verdade que esteja para além de nós? A resposta, naturalmente, é não, mas não porque o encontro que resulta da abertura ao desconhecido não seja possível e sim porque o desconhecido não nos é inteiramente desconhecido. Podemos falar de um desconhecido inteiramente desconhecido de que nunca ousámos sequer especular? Digamos que há uma dimensão do desconhecido que deriva da ignorância e por isso é desconhecido, porque não o conhecemos, mas isso não quer dizer que a possibilidade do seu conhecimento não seja intrínseca à sua própria ignorância. O que não podemos de facto conhecer não chega a produzir ignorância, esta só existe quando a gnose é possível, e se gnose é possível basta criarem-se as condições para a sua formação que, mais cedo ou mais tarde, ela acaba por surgir. Um assunto por nós ignorado, por mais que nos pertença em potência, é para nós um total desconhecido que esconde a possibilidade de se dar a conhecer, é como se fosse algo de que não é possível formar conhecimento. Mas isto acontece exactamente porque, para evitar a angústia da possível perda de sentido do nosso ser no mundo, temos um mecanismo de defesa que elimina o conjunto das possibilidades que estão fora do nosso alcance perceptivo. A negação de um princípio pressupõe à partida a presença desse mesmo princípio que se nega. Se podemos falar em desconhecimento é porque o conhecimento é possível, e por isso não está completamente fora do nosso alcance. Tudo depende do que temos por verdadeiro e de como podemos chegar a conhecer a verdade. E a verdade, é possível? Existe verdade? Para esta pergunta não temos resposta. Ou até temos mas não é uma resposta simples ou directa, ela remete de volta à ideia de que se podemos desconhecer algo então o seu conhecimento é possível. O limite do nosso conhecimento possível está na nossa própria imaginação. O que eu não posso mesmo conhecer nem sequer desconhecer posso.

Como nos mostra Sócrates no Ménon de Platão, todos temos o conhecimento da verdade em nós, até um escravo sem formação em geometria sabe como fazer demonstrações geométricas, caso lhe sejam pedidas de modo a que ele as descubra por si próprio. Sócrates leva-o a conseguir esse feito pela associação de ideias que já lhe pertencem. O escravo era ignorante da demonstração geométrica, mas tinha em si a possibilidade desse conhecimento, bastou levá-lo a perceber isso mesmo. Esta é uma das formas que Platão usa para provar a proto-existência do mundo das ideias. Mas mais impressionante que isso é o próprio significado do termo grego para a verdade, tal como o podemos encontrar no poema de Parménides. A alétheia é um não-esquecimento. Lethe é um dos cinco rios do submundo na mitologia grega antiga, aquele de onde as sombras bebem para apagar as suas memórias e assim poderem reencarnar. Lethe é o esquecimento. Tendo regressado à vida, os sujeitos deste esquecimento imposto pelo rio, têm a possibilidade de recuperar o que conheciam através da progressiva eliminação desse mesmo esquecimento.

A verdade é um desvelamento, o retirar do véu que impede que ela se dê a conhecer ocultando-a. Mas esta desocultação não tem a ver com o que temos de determinado no mundo. É inadequado imaginar que se possa alcançar a verdade por via de uma procura que se arrogue a encontrá-la, partindo do seu próprio suposto pela adequação a uma tessitura de referências. Assim, uma procura que não passe por esse sistema desmistificante pode chegar a atingir o encontro por um desvelamento, tal como se dá uma revelação, como numa epifania. Eureca!!! É a própria disponibilidade atenta à abertura para o encontro, livre de uma doação de sentido que se possa reconhecer como intencional, sem qualquer interpretação prévia, é ela que nos pode dar esta clareira. Clareira que surge no meio da floresta porque existe uma floresta e é preciso caminhá-la com atenção a esta lucidez, sem nos concentrarmos na dogmaticidade dos diversos caminhos. É nesta abertura à luz das possibilidades que não estão determinadas por uma ciência rectificadora, que podemos compreender a noção do encontro, livre da tensão da procura que acaba por ocultar a possibilidade do mistério, tão importante no acesso ao desconhecido. O mistério, aqui, está no delimitar com máximo rigor o indelimitável, como quem vive realmente atento à prática da vida, enquanto esta é vivida, e pretende viver melhor sem que isso implique uma sua suposta forma verdadeira. Isto porque a verdade, para não ser um conceito vazio, precisa de manter-se neste lugar da abertura ao encontro das possibilidades não realizadas. A verdadeira verdade encontra-se na abertura à potência. Percebida a possibilidade do encontro na alteridade aparentemente inacessível, só nos falta uma prática constante do ser-se aberto e do estar-se na abertura.


Sara Constança, Novembro 2010

02 setembro 2010

Mougongo


O arco da iniciação Bwiti.

05 julho 2010

A primeira natureza da luz


































Quando pensamos na antiguidade, nos episódios históricos que já foram, não imaginamos que seja possível retomá-los, como se pudessemos reviver o simpósio de Platão, e ouvir em primeira mão o discurso de Aristófanes. Mas, de certa forma, é isso que a ESA está a tentar fazer com o nosso céu. A "máquina fotográfica" do Planck dá-nos de volta uma resonância da primeira luz da nossa existência universal. É tão incrível quanto isso! Uma fotografia da primeira luz de todas as luzes de sempre. Não será a primeira fotografia mas é a primeira fotografia da primeira luz deste universo.
























Um mapa completo do nosso céu, que por ter sido feito nas nossas imediações, apresenta o ângulo fotográfico subjectivo da Terra, captando os gases e o pó celestial de onde se formaram todas as estrelas à cerca de 14 mil milhões de anos. Para isto ser possível os sensores do satélite tiveram de ser arrefecidos até muito próximo do zero absoluto, de modo a captarem-se variações de temperatura que são cerca de um milhão de vezes menores que um grau. Se o zero absoluto, medido em graus Kelvin é zero, 0ºK, em graus Celcius são -273,15ºC, e os sensores do aparelho trabalham a -273,05ºC. A viagem no tempo para a primeira luz faz-se praticamente no zero absoluto. E a imagem que vemos abaixo inclui relíquias de radiação da luz do Big Bang, a tal primeira luz, a pontilhado amarelo, inclui o pó celestial da nossa galáxia a azul, e a vermelho temos gases de temperaturas altas. Na imagem de cima a Via Láctea é desenhada por uma risca horizontal quase branca, de onde se vêm partir, para cima e para baixo, correntes de pó celestial frio que se estendem por milhares de anos luz.




























Este telescópio faz uma fotografia panorâmica da anisotropia esférica de todo o universo em torno de si mesmo, captando as já muito arrefecidas micro ondas da radiação cósmica de fundo do nosso universo, que, segundo a astrofísica, é o resultado actual da primeira emisão de luz do universo, o primeiro nascimento, a primeira natureza da luz, o Big Bang. É isto que espanta sem fim... uma fotografia do Big Bang de dentro para fora.


















O Planck faz um varrimento do céu por aneis que têm, cada um, cerca de 15º em largura, demorando mais ou menos seis meses a completar a imagem do céu inteiro. O tempo operacional do Planck foi calculado em 15 meses, pelo que serão feitos dois varimentos completos do céu.



E é assim que recuando no tempo enquanto se olha para a frente, pudemos retomar o primeiro de todos os discursos, e perceber como viemos aqui parar a este lugar no cosmos. Será que o Big Bang é mesmo o início de tudo? Será que tem vindo a expandir-se e assim continuará, até à escuridão, como é dito na mitologia contemporânea? Será que podemos continuar a dividir o conhecimento entre crentes, ateus e agnósticos?

09 junho 2010

04 junho 2010

Quando é que isto vai acabar???


02 junho 2010

...a little bit better


An interesting view in how to make the world a little bit better...

27 maio 2010

Quando vamos ser humanos???

ESTA MÃE NÃO DESISTE - RUI PEDRO
QUE GRANDE MÃE...
Só por isso devemos reencaminhar!

RUI PEDRO - impossível não reencaminhar!

Esta mensagem é um dos métodos a que a mãe do Rui Pedro tem recorrido para que a ajudem a encontrar o filho, já que as autoridades Portuguesas têm deixado arrastar este caso há já Nove anos.
O mínimo que podemos fazer é reenviar esta mensagem aos nossos contactos na esperança de que um dia ela venha dar os seus frutos.

Por favor divulguem esta mensagem aos vossos contactos nacionais e internacionais.



26 abril 2010

The dark side of chocolate



Miki Mistrati e U. Roberto Romano, The Dark Side of Chocolate, 2010.


The Dark Side of Chocolate é um documentário sobre alegações feitas acerca do tráfico de crianças e trabalho infantil, pela indústria internacional do chocolate.

«Enquanto apreciamos o doce sabor do chocolate, a realidade é completamente diferente para as crianças africanas.»

Consumidores de chocolate por todo o mundo ficaram escandalizados em 2001, ao descobrir que a escravatura, o trabalho infantil e outros abusos, estavam em uso nas roças de cacau da Costa do Marfim, país onde se produz quase metade do cacau para todo o mundo. Cedo se seguiu uma avalanche de publicidade negativa e consumidores à procura de respostas.

Dois membros do Congresso dos Estados Unidos, o Senador Tom Harkin do Iowa e o Legislador Eliot Engel de Nova York, adereçaram a questão propondo uma lei ao Sistema Federal para certificar e etiquetar produtos de chocolate como "slave free" (sem escravatura). A medida passou à Casa dos Representantes e criou um potencial desastre económico para a Cargill, Archer Daniels Midland Mars, Hershey’s, Nestle, Barry Callebaut, Saf-Cacao e outros produtores de chocolate. Para evitar uma legislação que iria obrigar as companhias do chocolate a marcar os seus produtos com etiquetas "no child labor" (sem trabalho infantil) (para a qual muitos produtores não chegariam a poder certificar-se), a indústria defendeu-se e acabou por ter de aceitar um protocolo voluntário, a implementar até 2005, para terminar com o abuso e o trabalho infantil forçado nas roças do cacau.

Em 2005 a indústria do cacau não foi capaz de cumprir com o protocolo e estabeleceu-se uma nova data para 2008. Em 2008 os princípios do protocolo continuavam sem resposta e levantou-se ainda uma outra data limite para 2010.

E em 2010?

Quase uma década depois e milhões de dólares gastos na tentativa para erradicar o tráfico de crianças e o trabalho infantil do negócio do cacau, será que alguma coisa mudou?

Miki Mistrati e U. Roberto Romano iniciaram uma investigação discreta, para averiguar se estas alegações de trabalho infantil na indústria do cacau ainda eram pertinentes na actualidade.


Março, 2010
Miki Mistrati & U. Roberto Romano



A exibir brevemente na SIC


Tradução do Skapsis

25 abril 2010

Bodas de prata em cativeiro

16 abril 2010

Economic hit man





John Perkins in Talking Stick about his 2004 book
Confessions of an Economic Hit Man, September 21, 2007.

14 abril 2010

Bless the rains



Toto, Africa, by Perpetuum Jazzile, 2009.

07 abril 2010

Para além dos bastidores da propaganda (relações públicas)



Assassínio no Iraque em 2007 de um fotojornalista da Reuters e do seu motorista, entre crianças e outros.

Collateral damage??!?!!?!!!? Depois de ver matar uma série de pessoas inocentes a partir de uma metralhadora num helicóptero americano levanta-se uma núvem de poeira. Quando a poeira assenta e começam a ver-se os corpos estendidos no chão, ouve-se dizer «Oh, yeah, look at those dead bastards.» E de seguida a resposta... «Nice!»

A versão posta acima, do WikiLeaks, está gentilmente editada para promover uma leitura precisa das posições das vítimas, e uma noção realista da disposição psicológica dos intervenientes no assassínio de Namir Noor-Eldeen e Saeed Chmagh, entre muitos outros inocentes. É preciso ver este filme com atenção! No entanto, o Skapsis alerta para o facto de que este video, captado no ponto de vista do agressor, é um potencial elemento de perturbação, susceptível de abalo psicológico para os mais sugestionáveis.


A 6 de Abril de 2010 na PDN.

Graphic video footage showing US soldiers taking aim at an Iraqi photojournalist from a helicopter and shooting him to death has shown up on the wikileaks.org web site. The footage also shows the shooting death of the photographer's driver, another Reuters employee. The
video was recorded on July 12, 2007 from the helicopter from the point of view of the gunner.


Reuters has been asking for the release of the footage as part of its investigation of the deaths of the photographer, 22-year-old Namir Noor-Eldeen, and his driver, Saeed Chmagh, 40. Two children were also wounded in the attack. According to a pre-amble added to the video, the military had initially claimed that the victims died in a battle between US forces and Iraqi insurgents. The military concluded after an investigation that the the soldiers had acted according to the rules of military engagement.


The video includes an audio recording of the helicopter crew reporting a group of men walking down the street with "weapons." They identify those weapons at first as AK-47s, and ask for permission from their base commanders to "engage." Permission is granted. "Just fuckin, once you get on 'm just open 'em up," a voice on the recording says after one helicopter crewman reports that the men are behind a building.


Soon the helicopter crew sights the men milling around the street, ignoring the helicopter and making no apparent effort to hide. One of the men holds a camera with a long lens, which is quickly misidentified by the crew as an RPG. The man holding the camera appears to be talking on a cell phone. With the men in view, a commander says,"Light 'me all up." The gunner hesitates, and someone else says, "Come on, fire!" The gunner fires, and as the men go down, a voice says, "keep shoot'n, keep shoot'n." One crew member reports that they
had "engaged" all eight individuals on the ground, but another says "we see two birds and we're still fire"--indicating that two of the men were on the run. A commander swears at the gunner, who opens fire again and then says, "All right, hahaha, I hit 'em."


The helicopter continues to circle around, directing ground crews to the scene. One of the injured men attempts to get up, but the helicopter crew refrains from shooting him because he doesn't have a weapon. Before US military ground crews arrive, a van arrives to pick
up the injured man, who is identified in the released video as Saeed Chamagh. The helicopter crew presses for--and finally gets--permission to fire upon the van and the people around it. When US military ground crews finally arrived, they found two wounded children inside the van, and 12-15 other people dead, including the two Reuters journalists..


In a statement, David Schlesinger, editor-in-chief of Reuters news said, “The video released today via Wikileaks is graphic evidence of the dangers involved in war journalism and the tragedies that can result.” Calling the deaths of Namir and Saeed "tragic," he said, "We continue to work for journalist safety and call on all involved parties to recognise the important work that journalists do and the extreme danger that photographers and video journalists face in particular."

20 março 2010

Totum



















Lisboa 2010
(Panorâmica lowfi com telemóvel de gama baixa)

Exposição de Ricardo Pacheco
18 de Abril da 20 de Maio
Galeria Prova de Artista


TOTUM
desenhos de Ricardo Pacheco

Ricardo Pacheco nasceu em 1974 e fez o seu percurso académico na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Vive e trabalha em Lisboa, mas o seu trabalho não têm um lugar fixo nem surge de onde se possa indicar — pertence exclusivamente à pintura. Pintura do interior. Não do interior gasto e comum das novas tendências mas um interior completamente perene e genuíno.

O seu trabalho é honesto, inteiro e sincero. É de um desenhador hábil que desde muito cedo deixa cair o traço que empresta à sua imaginação, e nos mostra os outros que também somos. Sempre teve uma grande facilidade para a representação visual do mundo que o rodeia, mas é a imaginação profunda que começa cada vez mais a ter lugar nas suas obras: uma relação pura e desprotegida, perigosa e arriscada, com essa coisa que é o mundo do imaginar, da imagem que não tem forma, corpo ou matéria. E mergulha nela com a mesma intensidade como na água que o sacia. Mas a sua obra nada tem de abstracta, embora isso possa não ser claro à partida. É uma representação constante do outro que está fora e dentro dele mesmo, um mundo figurativo que existe mas que nem sempre temos a possibilidade de contemplar.

Na relação com o outro, e com o nosso próprio identificável, o que mais nos toca é o rosto. O rosto do amigo, o rosto da mãe, se ainda o temos connosco… o rosto da nossa casa, do nosso corpo, da terra que nos diz. O rosto ancestral do mundo, da ressonância histórica que dá forma e lança. Aquela fisionomia inefável do Tu e Eu. A relação pessoal que temos com certos lugares. A nossa natureza: quer ela seja urbana, rural, política ou tão simplesmente natural. A nossa própria natureza enquanto paisagem de um mundo que dificilmente chegamos a conhecer. Que forma têm as coisas? O que é o formal? Ricardo não procura o rosto meramente dito, ou tão facilmente reconhecível como face, mas um que lhe diga quem é e onde está com mais lealdade. É o rosto que está no espelho que fica por detrás dos olhos. Na verdade, o rosto é uma máscara que nos trava a atenção ao reconhecível, mas estamos tão habituados a fazer um reconhecimento simples e directo das fisionomias mais íntimas, por associação às faciais da superfície, que por ínfimos instantes de segundo julgamos compreender, e não nos é dada a oportunidade de saber isso em consciência. Aquilo que nos é mais familiar é o que de mais estranho nos é dado acesso.

De frente a uma tela branca temos tendência para procurar. «O que é que eu vejo, onde está o rosto?» E essa força que nos leva à procura é o que impede o encontro. Tão simples como encontrar exactamente o que procurávamos, e perder o que não sabíamos que lá estava. Será que sabemos quem somos? Pode argumentar-se que somos quem achamos que somos, e fique-se por aí para não complicar mais o que já é por demais complicado. Mas isso será o que achamos que somos, não aquilo que somos, e o que achamos nessa procura não é o que deixamos perdido quando a procura comanda o encontro...

O encontro é a metodologia deste artista que não procura, num processo criativo que se deixa encontrar a si e por si. O encontro de si mesmo vezes e vezes sem conta, coado pelas múltiplas relações com o mundo e com as pessoas. É na sua incansável abertura à vida e ao que nela advém, nos ritmos do corpo, nos passos dos animais e nos voos auspiciosos das aves, nas árvores e os seus ramos, nas trocas felizes ou difíceis, na fertilidade da constante partilha com quem gosta de cultivar. Nas tão longas conversas que tem com os seus amigos.

Estas pinturas e, sobretudo, estes desenhos do Ricardo Pacheco, dão-nos os percursos de toda esta topografia interna, dão-nos o que está lá dentro e a maturidade sacra do encontro. A consistência da obra do artista, obriga-nos a olhar toda ela para poder observar uma pequena série como esta. E o mesmo acontece no sentido inverso, tal é a sua unidade. Os desenhos que agora nos oferece e dão nome à sua presença nesta mostra, o título deste texto, podem tomar-se como um marco alcançado da sua própria representação.

Sara Constança
Lisboa, 12 de Março de 2010

10 março 2010

Is The Catholic Church A Force For Good In The World? Ou será que deviamos falar do Tempo?

Stephen Fry on The Intelligence2 Debate 2009

A pergunta que compete fazer-se a estes brilhantes comunicadores, como é o caso de Stephen Fry, que me deixou agarrada ao ecrã sem deixar passar uma única sílaba do seu elequente e muitíssimo bem articulado discurso, não é se a Igreja Católica é ou não uma força para o bem no mundo.


Como sistema político que é (e que tem um estado próprio tal como indica Fry tão acertadamente), passa pelos seus altos e baixos, por vezes faz melhor, por vezes pior, mas uma coisa é certa e sabida. A Igreja Católica NÂO é uma força para o bem no mundo, e não é pode ter ouvido um discurso tão convincente como este que uma pessoa esclarecida chega a esta cnclusão. Haverá seguramente muitos indivíduos patrocinados por esta igreja que o são, como foi o caso gritante da Madre Teresa, mas a instituição, porque sim, trata-se de uma instituição, ou melhor, para não adoçar o pão ázimo, uma corporação com tudo o que isso tem de mau. A resposta seria:

The Catholic Church is a force for their own good and the world not only comes in second place as it has no place at all if it does not benefit the church.

Mas, retornando ao que me levou a iniciar esta posta, a pergunta que faço a qualquer proponente do ateísmo, que sem dúvida não pretende manipular o mundo como a Igreja Católica ainda faz em seu proveito, é se a solução que apresentam traz alguma proximidade com o que é a experiência do humano. O ateu, só por ser ateu, fundamentalista ou não, está em negação automatica de um deus, ou Deus, seja como for, deuses, etc, em prol de como bem disse Fry, mais uma vez, aquilo em que acredita é a Iluminação, não a Ilimination mas o Enlightment. E o Enlightment que porpõe, ou o exemplo que dá, incontornável, é o da ciência. Ora, e o que é isto de ciência, perguntamos nós? Foi Galileu que deu os primeiro passos, mesmo retirando as suas palavras depois da tortura, receando o destino que a Igreja Católica ofereceu a Copérnico. A ciência é, como disse platão (episteme), uma crença verdadeira justificada. É verdade, é uma crença, mas é uma crençe que tomamos como verdadeira porque está justificada. Isto é certíssimo, tão certo quanto nada do que se escreve na Bíblia pode ter ou terá alguma vez (excepto no advento da viagem temporal) justificação, ou verificação, possível. Mas, e o ateísmo? Tem o ateísmo algum grau científico ele mesmo? Terá a ciência, em último caso, o grau científico a que se arroga? Como se pode advogar meramente o termo "ateu"? Sabemos que deuses, deus, ou Deus, não existe(m)? Podemos justiviar, verificar e provar a sua inexistência? A resposta é simples, tanto para uns quando para os outros. NÃO!! Simplesmente não é possível saber.


Um ateísta, ou um católico, muçulmano, etc, etc, etc, diriam que isso é o argumento do agnóstico, e que para o agnóstico nada é possível saber. Mas uma coisa é certa, ao contrário que dizia Descartes, tenho a certeza de uma coisa e só dessa coisa mesma, estou aqui a escrever emocionadamente sobre o que acabei de ouvir pela palavras de um dos melhores oradores que já ouvi falar no assunto.


Não, não sou agnóstica. Não, não sei se deuses, deus ou Deus existe(m), nem ponho isso em questão, mas uma coisa sei de facto, e, chamem-lhe o que quiserem, há uma coisa que existe acima de tudo, sobre tudo, sob tudo e por tudo, e essa é coisa é a mais simples e complexa de todas, e não vale a pena chamar-lhe mais nomes que o simples nome que ela tem. Se há alguma coisa que existe é o Tempo. E se há quem diga que o tempo é deuses, deus ou Deus, então qual é ou onde está o católico, muçulmano, etc, etc, etc, qual é o ateu que me vai dizer algo em contra? Talvez me diga que não, que não é um deus ou Deus, mas isso é tão vazio como dizerem-me que o Tempo é a ponte que ele, ou eles, ou Ele fez/fizeram para nos dar lugar. Em suma... non sense. O Tempo, na sua própria inacessibilidade a meros humanos como nós, no máximo, é ele mesmo, e não houve ninguém como o Santo Agostinho para nos mostrar quanto impossível é saber do que se trata.


Contudo, para resumir, o Tempo, esse sim, à sua própria maneira, e a tentar combater todo o disparate e asneira (tremenda hubris) que fazemos, é quem faz algo de bom pelo mundo.

P.S. Digo Tempo mas podia dizer Existência, mas como não quero correr o risco de soar a existencialista, que deveras não sou, perfiro chamar-lhe Tempo, é o Ser do Tempo. Tão "simples" quanto isso.

01 março 2010

Several less cars















 It's the ConferenceBike!


02 fevereiro 2010

Caríssimos junkies, a globalização tem os dias contados

Ontem no Público online:


Estudo da Universidade do Minho

Silva Pereira reafirma linha do TGV para Porto e Vigo apesar da falta de retorno

01.02.2010 - 14:15 Por Maria Lopes
O ministro da Presidência reafirmou hoje a intenção do Governo em construir as linhas de alta velocidade Lisboa-Porto e Porto-Vigo, apesar de um estudo encomendado pelo ministério das Finanças concluir que estas terão pouco retorno ou até mesmo prejuízo.
 
Daniel Rocha

O estudo encomendado pelo ministério de Teixeira dos Santos a um professor da Universidade do Minho debruça-se sobre o pacote de grandes obras públicas projectadas pelo Governo. E conclui que os investimentos necessários para as duas linhas de TGV para Norte só a longo prazo poderão ter algum retorno no caso do troço Lisboa-Porto e que o as contas do lanço Porto-Vigo deverão mesmo ser sempre negativas. A excepção a este cenário cinzento é a linha Lisboa-Madrid.

Questionado pelos jornalistas na conferência de imprensa sobre a reunião extraordinária do Conselho de Ministros, Pedro Silva Pereira desvalorizou as conclusões do estudo e lembrou que “todos os investimentos implicam, numa primeira fase, um endividamento”. No caso do TGV, vincou, “são investimentos que promovem, a prazo, o retorno para a economia”, e “as análises de custo-benefício são favoráveis a esses investimentos”.

“Não podemos confundir as lógicas de curto prazo com as lógicas estruturais. E o país está numa fase em que precisa de fazer escolhas estruturais”, afirmou. E avisou que Portugal “não pode demorar décadas a discutir os investimentos”, como “os 50 anos para discutir o Alqueva, 40 para o novo aeroporto, e 20 para a alta velocidade”.

“O estudo confirma que estes investimentos são úteis e modernizadores da economia portuguesa”, reiterou o ministro.

um comentário interessante:

Necessidade do TGV

Já alguém pensou como vamos transportar mercadorias de/para a Europa quando já não houver petróleo, ou quando este estiver demasiado caro para ser rentável? Certamente não será com nenhum meio de transporte que consuma um derivado do combustível fóssil. Pois bem, é preciso criar linhas de comboio novas para transportar as pessoas, uma vez que as actuais farão falta para o transporte das mercadorias. (Sim, eu sei que as auto-motoras trabalham a gasóleo. Será preciso fazer também alguma coisa acerca disto) Espero que vejam as pessoas tenham a capacidade de ver as necessidades do País a longo prazo. É que para construir infra-estruturas, a nossa indsútria também se alimenta de petróleo. E se este líquido precioso não existir, a construção de uma linha férrea será muito mais cara. Nessa altura Portugal ficará definitivamente isolado da Europa e do Mundo à espera de uma alternativa energética. A propósito, Portugal não tem necessariamente que comprar comboios. Desde que hava linhas de TGV, os espanhóis e os franceses podem explorá-las. Alguém que me corriga se eu estiver errado no que disse.

 Pois é, já nos pusemos a pensar sobre um futuro relativamente próximo sem petróleo? Sem aviões, sem carros, sem máquinas agrícolas, sem transportes baratos ou rápidos, com uma redução esmagadora na produção de todo o sector industrial do mundo... uma lista infindável de itens que actualmente temos como de absoluta necessidade. Estamos de tal modo viciados numa economia de consumo dos combustíveis fosseis (para não falar dos outros consumos que nos tornaram autênticos junkies) que já não somos capazes de ver o buraco em que nos metemos.

Concordamos com a construção do TGV? Hummm. A resposta imediata é não... claro! Caríssimo, pouco rentável, para minorias, etc, etc, etc. Mas se nos pusermos a pensar nas implicações de um futuro próximo sem petróleo ou energia alternativa que o substitua, a reposta já não pode ser tão leve ou superficial.

Um mundo sem petróleo... ora aí está uma matéria interessante a dar muito que pensar.

21 janeiro 2010

Since 'It' Was
























Belém 2010


What urged me to come
and say about was the misfortune I had to endure last week in Belém.

I left the ride
near the (summer) restaurants
and set in my own way,
enjoying the rain?,

glad to go by my favourite tree
in Belém. The way to CCB.

For my surprise, as I was going forward, a memory lapse.

Yes, [some time had passed since my last visit to these flat gardens, and I forgot]
where the tree used to stand.

So strange,
never in my life this had happen
before, I must be getting old.

All I could see there were the other trees,
with ‘whom’ I never develop a friendship, and,
it seemed,

all the seagulls of the river mouth were there too.

Unusual.

Where is my tree? I thought.
— As if they were ever mine—
But suddenly I came to realize
they
was probably someone's
trees.
Yes, trees,

the trees I was happy to be passing by,
since I decided early in the morning to go
and see Bacon thinking about Ingres, was
an embrace tree of two distinct trees, as if
they could be anthropomorphized into a couple.

I kept on going
forward, intrigued, and
it wasn't till I got very close
that I understood my memory is [still in good shape.
What a horrifying image that was,]
to know about my own memory

with the death of a friend.
Well, I wouldn’t say it was death what petrified me.
Death is hurtful but it’s natural. One way or another
we all expect death.

Call it a new beginning...

Love!
What ever...

For all I know
(or knew) this tree was a monument.
Old and crumbling, but very strong
and capable of many more
friendships like the one
I was happy to enjoy.

Someone had passed and
decided it was no more and
took her stand away, leaving
just the roots for all to see.

And if death was the issue, my friend
was stripped from the new beginning.

She still exists in me, but no new friends will come
to appreciate how wonderful it could be,
that two very different trees
would grow side by side from the same ground
into a whirling twist,

dancing to the sky. Isn’t that what trees do with the wind?
Why take ‘it’ away?

Categorias

Condições de Reutilização

spintadesign

Free Blog Counter